O SALAME
Quando se fala da cultura gastronômica italiana, não se pode ignorar a extraordinária e antiga arte que leva à criação do salame. Esta saborosa salsicha é muito mais do que apenas um alimento. Ela abrange uma fascinante parcela de história, artesanato e muitas tradições regionais variadas.
Os meses de inverno sempre foram as épocas preferidas para o processamento de carnes curadas. Um período tão importante que também deixou sua marca na arte. Um exemplo maravilhoso é o baixo-relevo medieval representando o mês de fevereiro na catedral de Ferrara, onde o antigo escultor esculpiu salames e salsichas pendurados para amadurecer em pedra.
A primeira evidência de processamento de carne para preservação remonta aos tempos antigos. A arte de salgar e temperar já era bem conhecida na época romana. Os romanos usavam técnicas de preservação baseadas em sal, que eram essenciais para prolongar a vida útil da carne em uma época em que a refrigeração não existia. O termo salume na verdade deriva do latim “salumen”, que significa “conjunto de coisas salgadas”.
Um dos embutidos romanos mais conhecidos era a lucanica, uma salsicha que se acredita ser originária da Lucânia (atual Basilicata) e ainda muito apreciada atualmente. O poeta Marco Terêncio Varrão escreveu extensivamente sobre isso, elogiando os lucanianos por sua habilidade em produzir esse salame requintado.
Durante a Idade Média, o processamento da carne suína passou em grande parte para mosteiros e abadias. Os monges conseguiram manter e desenvolver as técnicas de abate de carne de porco transmitidas pelos antigos romanos e espalhá-las para várias áreas, fazendo do salame uma presença constante nas despensas medievais (como testemunha o baixo-relevo ferrarense).
Durante o Renascimento, a arte da charcutaria tornou-se ainda mais refinada. As famílias nobres sempre tentavam oferecer comida requintada aos seus convidados e o salame era muito adequado para ser apresentado como um produto de alta qualidade. A cidade de Norcia, na Úmbria, foi o local de origem de muitos dos artesãos mais habilidosos no manuseio de carne e na produção de salsichas, tanto que a atividade em si era chamada de “norcineria”.
As receitas variavam de região para região, refletindo tradições locais e influências geográficas. O uso de especiarias, vinhos locais e ervas aromáticas tornou-se cada vez mais comum, criando uma riqueza de sabores que tornava único o salame produzido em cada aldeia.
O século XIX viu o início de uma espécie de padronização e codificação das técnicas de produção de salame. Guias e manuais de abate de carne suína começaram a ser publicados, fornecendo uma base de conhecimento comum. Cada território continuou a desenvolver suas próprias especialidades, mas com maior consciência de técnicas de higiene e conservação.
No século XX, o crescimento da indústria alimentícia levou o salame às mesas do mundo todo. Apesar da industrialização, pequenas empresas familiares e produtores artesanais continuaram e continuam a preservar e aprimorar tradições antigas. O resultado é uma extraordinária diversidade de produtos que mantêm a essência do açougue de carne suína italiano.
Entre os mais famosos embutidos italianos, o Salami di Milano certamente ocupa um lugar de honra, conhecido por sua granulação fina e sabor delicado, o Salami di Napoli com sabor mais picante e intenso, a Finocchiona, um embutido típico da Toscana, aromatizado com o uso de sementes de erva-doce e o Salami dei Colli Morenici del Garda, um excelente produto que é o orgulho do interior do maior lago da Itália.
Em muitas regiões italianas, o vinho é adicionado à mistura de carne durante o preparo do salame. Isso não só acrescenta complexidade ao sabor, mas também atua como um conservante natural.