Nascido na Abissínia (atual Etiópia), Kafur foi um eunuco negro traficado nos mercados de escravos da Núbia. Sua trajetória começou na infância, quando foi comprado por um comerciante de óleos e submetido a trabalhos exaustivos em um moinho de óleos, sofrendo sob a crueldade de seus senhores. Sua vida mudou quando o escritor Mahmoud bin Wahb o adquiriu, reconhecendo seu potencial. Wahb não só o libertou da exploração, mas também o educou, ensinando-lhe a ler e escrever, e posteriormente o apresentou a Muhammad ibn Tughj al-Ikhshid, fundador da dinastia Ikhshidid.

O governante, impressionado com sua astúcia e inteligência, concedeu-lhe liberdade, integrou-o à sua corte e nomeou-o tutor de seus filhos. Kafur ascendeu na hierarquia militar, consolidando poder até se tornar regente após a morte de al-Ikhshid. Com habilidade política, afastou os herdeiros do trono e assumiu o controle do Estado, governando de facto o Egito, o Levante e o Hejaz por 23 anos (de 946 a 968), até sua morte aos 65 anos.

Apesar de suas conquistas, sua aparência era alvo de escárnio. Descrito como fisicamente marcado — rosto deformado, lábio inferior perfurado e andar arrastado —, ele desafiava os padrões de nobreza da época. O célebre poeta Al-Mutanabbi, após não receber recompensa por um elogio forçado, satirizou-o em versos: *”Não compre um escravo sem que ele carregue um bastão; escravos são vis e insolentes”*. A crítica, porém, não apagou seu legado.

Kafur, quarto governante da dinastia Ikhshidid, tornou-se símbolo de ascensão improvável: de escravo marginalizado a líder de um império, deixando uma marca complexa na história islâmica, entre preconceito e poder.